terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Cavalo-marinho tipo exportação

por Clarice Couto | Fotos Ernesto de Souza

Nas praias próximas a Fortaleza, CE, é comum o comércio ilegal de um pequenino animal aquático, pouco mencionado até pelos defensores da biodiversidade: o cavalo-marinho. Bastante visados pelos mercados japonês e europeu, onde a aquariofilia (criação de animais aquáticos ornamentais em aquário) conta com um grande número de adeptos, os cavalos-marinhos são retirados com frequência do litoral cearense por pescadores em busca de renda extra. A prática tem seu lugar porque a cota estabelecida pelo Ibama para a venda legal de cavalos-marinhos – 250 animais por ano por empresa autorizada – é insuficiente para atender à demanda mundial. Espectador deste cenário, o Instituto de Ciências do Mar (Labomar), da Universidade Federal do Ceará, pesquisa, há seis anos, o processo de criação em cativeiro destes animais marinhos.
A meta final dos estudos é levar aos pescadores treinamento e material apropriado para que possam criar cavalos-marinhos e abandonar a captura em ambiente natural. Luis Parente Maia, coordenador acadêmico do Labomar, acredita que, com a oferta de animais provenientes de criatórios, a cota oficial deixará de ser necessária, já que foi estabelecida para limitar a exploração da espécie na natureza. “Há uma demanda gigante pelo animal. Por isso, os pescadores os vendem em feiras, de forma clandestina”, diz.
Boa parte dos processos de reprodução e engorda está dominada. Maia explica que o fato de os cavalos-marinhos pesquisados pelo instituto (gênero Hippocampus) serem nativos da região, mais especificamente de estuários, beneficiou o andamento do trabalho. Na técnica desenvolvida pelo Labomar, a desova de ovos e sua fecundação ocorre de maneira natural, sem o expediente da indução hormonal – comum na reprodução em cativeiro de peixes.
Um casal produz, em média, 250 filhotes. Destes, em torno de 40% sobrevivem, o que resulta na obtenção de 60 a 80 cavalos-marinhos a cada dois meses, quando se dá a reprodução. Esse percentual de sobrevivência, entretanto, ainda pode ser elevado. “No mercado internacional, um cavalo-marinho pode chegar a US$ 120”, afirma o coordenador do Labomar.
O próximo passo da pesquisa é aprimorar os estudos relacionados à alimentação dos animais. Na natureza, a espécie se alimenta de um minúsculo crustáceo, chamado artêmia, mas o objetivo é que os pescadores alimentem seu “cardume” com ração. Antes de bater o martelo nesta opção, porém, os pesquisadores analisarão se a mudança na dieta afeta a cor dos animais, fator muito observado na aquariofilia.
“A ideia é entregar aos pescadores formas juvenis de cavalo-marinho (com oito meses de idade) condicionados a comer ração e tubos de ensaio com microalgas para alimentá-los por 60 dias. Após esse período, o cavalo-marinho estará pronto para deixar a artêmia e comer ração”, diz Maia.



Ariacó, cioba e pargo

Outra aposta do Labomar é a conclusão das pesquisas de reprodução e criação dos chamados “peixes vermelhos”, amplamente consumidos no Nordeste, mas até hoje obtidos apenas por meio da pesca. Ariacó e cioba são alguns deles, além do pargo, cujos estudos devem ser iniciados neste ano. Com as etapas de reprodução e desova dominadas, o grupo já reúne conquistas importantes. Na engorda dos filhotes de cioba, 50% da farinha de peixe normalmente fornecida como alimento foi substituída pela de soja, sem que o crescimento do animal fosse afetado. As condições climáticas do estado, como temperatura média do mar a 27 graus Celsius, permite que os pesquisadores obtenham resultados melhores que os já registrados em outras instituições de pesquisa no mundo, ainda que em pequena escala.
Localizado à beira do estuário do rio Pacoti, o Labomar tem limitações de espaço, condição que tem restringido o avanço dos estudos de larvicultura e alevinagem. “A cada desova, uma fêmea libera de 600 mil a 700 mil ovos, dos quais entre 60% e 70% se transformam em larvas. Elas precisam de cuidados extremos ao longo de 35 dias, até se transformarem em alevinos (peixes pequeninos) ou morrem todas de uma vez. Temos dois problemas: nossa capacidade de estocagem é de 2 mil alevinos e os peixes vermelhos são recifais, vivem em recifes, porém nossas pesquisas são realizadas com água do estuário”, explica Rossi Lelis Muniz Souza, pesquisador do instituto. Ainda assim, o aproveitamento dos ovos analisados pelos pesquisadores, incluindo todas as fases da criação, foi de 10%, enquanto a média mundial é de 4% a 5%.
Para sobrepor estes obstáculos, o Labomar enviou ao Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA) um projeto para construção de um centro maior em Beberibe, CE, com 7 mil metros quadrados de área, que permitirá o desenvolvimento das larvas e alevinos de peixes em água de mar. O objetivo final do trabalho, semelhante ao voltado aos cavalos-marinhos, é chegar a um pacote tecnológico que permita a produtores e pescadores criar estas espécies, além de povoar com alevinos áreas onde, no passado, houve fartura de peixes.


______
Fonte: Revista Globo Rural

Nenhum comentário: