terça-feira, 18 de maio de 2010

Peixes comerciais podem ser extintos em 40 anos


Amália Safatle
De São Paulo


Se US$ 8 bilhões fossem aplicados anualmente na reconstrução dos estoques pesqueiros marinhos e na adoção de técnicas mais ecológicas de produção, essa indústria poderia elevar em 112 milhões de toneladas o volume de pesca e fazer com que os benefícios para os produtores, os consumidores e a economia como um todo totalizassem US$ 1,7 trilhão durante os próximos 40 anos. É a verdadeira multiplicação dos peixes.
Trata-se de um exemplo simples e didático de que produção com racionalidade ecológica é mais consistente do ponto de vista econômico. Talvez por isso tenha sido divulgado como chamariz do relatório Green Economy, produzido pelo programa ambiental das Nações Unidas (Unep) e por economistas, cujos resultados prévios foram divulgados ontem, 17 de maio, em Nova York.
Esses dados prévios, que abarcam também os setores de água e de transporte, são uma contribuição do Unep para a reunião preparatória chamada Rio+20, a ser realizada no Brasil em 2012, passados vinte anos da ECO 92. O relatório integral aborda 11 setores, "de agricultura e lixo a cidades e turismo", a ser publicado até o final deste ano.
Por ora, o estudo traz conclusões interessantes. Parte do investimento proposto para a recuperação dos estoques pesqueiros, por exemplo, pode ser feito por meio da redução de subsídios à pesca que superexplora determinadas espécies, e com suporte financeiro aos pescadores que dependem desse meio de vida.
Segundo o relatório, do volume de subsídios dedicados à atividade pesqueira, estimado em US$ 27 bilhões, apenas US$ 8 bilhões são classificados como "bons" do ponto de vista da sustentabilidade, enquanto o restante contribui para a super-exploração dos estoques.
Esses subsídios, aliados à gestão ineficiente e à falta de uma lei e de seu cumprimento, fizeram com que cerca de 30% dos estoques pesqueiros sejam classificados como colapsados, ou seja, já rendem menos de 10% do que poderiam.
Hoje, somente 25% dos estoques comerciais apresentam-se em situação ecologicamente saudável, e os pesquisadores estimam que, nesse ritmo, até 2050 todas as espécies comerciais terão colapsado.
Isso toma dimensões ainda mais preocupantes dado que os peixes são fonte primária de proteína para cerca de 1 bilhão de pessoas. Além disso 520 milhões, direta ou indiretamente, sobrevivem da atividade pesqueira.
A proposta do estudo é que o investimento não só melhore a gestão da atividade pesqueira, como inclua políticas tais como cotas negociáveis de exploração e o estabelecimento de Áreas Marinhas Protegidas, de modo a permitir que os estoques hoje exauridos se recuperem e voltem a crescer.

Enquanto isso, no Brasil...

Um representante do Ibama afirmou à Folha de S. Paulo que "quatro ou cinco espécies de peixes têm potencial de se extinguir, mas assumimos esse risco".
Segundo o jornal, a frase veio de um biólogo do Ibama, Antonio Hernandes, quase às vésperas do Dia Internacional da Biodiversidade (comemorado no próximo dia 22), em resposta à crítica de ictiólogos (biólogos especialistas em peixes) ao estudo de impacto ambiental produzido para a usina de Belo Monte.
Hernandes afirmou que, pior que a extinção, seria a construção de 25 termelétricas movidas a combustível fóssil.
À parte o fato de que há uma série de alternativas menos impactantes do que Belo Monte para se evitar as termelétricas, será que os estudos de valoração econômica da biodiversidade já estão tão adiantados assim? Pelo raciocínio, uma espécie de peixe equivale a cinco usinas termelétricas, é isso? Essa conta é inédita.


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