quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Peixe temporário raro é descoberto em Formosa

Leilane Menezes

Pesquisadores do Jardim Botânico de Brasília encontraram uma nova espécie de peixe, do tipo killfish (1), em uma poça d’água em Formosa (GO). Diminuto, o animal tem por volta de 2cm e chama atenção por apresentar tons avermelhados. Trata-se provavelmente de um subgênero de Simpsonichphye radiosus, variedade já vista naquela região. Mas ainda é preciso esperar o resultado da análise de um especialista do Rio de Janeiro para dizer ao certo a raridade e o ineditismo do exemplar.
O killfish é difícil de se ver, a não ser de perto: mede em torno de 2cm
O gestor ambiental e gerente de preservação do JBB, Alex Amorim, e os biólogos Fernando Nolli e Ricardo Alvarenga faziam um trabalho de campo, há 30 dias, quando encontraram em uma poça d’água, perto do Córrego Paranã, o pequeno peixe. “Estávamos em busca de um outro tipo de killfish já cadastrado nos nossos arquivos quando encontramos o novo. Ele não está em nenhum catálogo e é certamente muito raro”, acredita Amorim. “Peixes temporários são endêmicos, ou seja, um mesmo tipo só nasce em um lugar. Se você o encontra em determinado ponto do DF, ele só vai ocorrer naquele local.”
Um dos exemplares que os pesquisadores encontraram foi enviado para a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde passará por avaliação do professor Wilson Costa. “Ele é o especialista mais indicado para identificar essa espécie”, destacou Amorim. “Por ter vida curta, o killfish se encontra em risco de extinção em vários lugares. Os da África, por exemplo, são mais populares. Mas os do Brasil estão sumindo”, informou. O killfish é silvestre, mas, se reproduzido em cativeiro, pode ser comercializado. Nos últimos anos, os adeptos do aquarismo têm valorizado muito esse exemplar.

Acervo

As varreduras em terrenos do DF feitas por esses especialistas têm como objetivo manter viva a coleção do pesquisador e engenheiro químico Gilberto Campello Brasil, desaparecido em 2008, aos 63 anos. Ele dedicou 40 anos a pesquisas sobre peixes raros — especialmente o killfish — e espécies de cactus. Todo o acervo reunido em uma vida de trabalho foi doado ao Jardim Botânico de Brasília, após o misterioso sumiço do estudioso. Ele saiu da casa onde vivia, no Recanto das Emas, em 7 de novembro de 2008, e nunca mais foi visto. O caso corre em segredo de Justiça.
Desde então, os colegas de profissão se esforçam para não deixar morrer o legado de Brasil. “Lendo os documentos encontrados na casa dele e alguns artigos, descobrimos que Gilberto viajou o Brasil inteiro, do Rio Grande do Sul à Amazônia, com o objetivo de coletar novos exemplares de peixes e cactus. Ele criou o ambiente ideal para reproduzir os killfishes em cativeiro, e isso é algo muito difícil de conseguir”, relatou Amorim.
Quando encontraram a espécie provavelmente inédita, os especialistas seguiam as indicações existentes nos diários de campo de Gilberto Brasil. Ao receber as informações, não imaginaram que dariam continuidade a um trabalho sem precedentes nem registros científicos similares. “Quem tinha conhecimento de todas as áreas geográficas onde há killfish de Brasília e arredores era somente o Gilberto. Nos relatos dele não havia essa espécie que encontramos. Isso dá sustentação para dizer que ela é nova”, explicou Amorim. Wilson Costa, que vai analisar a espécie, era parceiro de estudos de Gilberto Brasil.
Com os exemplares deixados por Gilberto e os novos animais coletados durante as buscas pelo DF e pelo Entorno, o Jardim Botânico pretende montar o Espaço Gilberto Brasil, um centro de visitação no qual todo o acervo de pesquisas e descobertas ficaria exposto ao público. Será a primeira mostra de killfish acessível a visitantes de todo o Brasil. Além de pesquisar peixes, o engenheiro se dedicava a descobrir novos tipos de cactos. Há 500 espécies da planta vindas de várias partes do mundo na coleção. Entre elas existem pelo menos quatro ameaçadas de extinção.

1 - Vida curta
O killfish é um peixe temporário. Representa um grupo de espécies que vivem em poças e áreas alagadas e depositam os ovos quando a seca se aproxima. Eles vivem, no máximo, por um ano. Os ovos deixados, porém, resistem aos meses de seca e eclodem quando chega a temporada de chuvas. Assim, a espécie se perpetua.

Para saber mais
Três tipos diferentes


Diferentemente do que o nome possa sugerir — kill em inglês significa matar —, os killfishes não são predadores, e sim pequenos peixes de água doce que habitam riachos e até minúsculas poças de água da chuva. Essa é uma palavra de origem holandesa — killi significa riacho, ou seja, peixes de riacho. Os killis pertencem à ordem dos Cyprinodontideos, que engloba uma infinidade de gêneros e espécies, distribuídos em quase todas as regiões de clima tropical e temperado do planeta.
Em geral, são peixes pequenos e muito coloridos que normalmente vivem em ambientes saturados de material orgânico em decomposição e com pouco oxigênio diluído na água. Os killis não possuem o labirinto, órgão adaptado a retirar oxigênio do ar. Essa espécie pode ser dividida em três grupos: anuais, não anuais e semianuais — de acordo com as suas características reprodutivas. Gilberto diz ter preferência pelos anuais, ou seja, aqueles que se reproduzem apenas uma vez por ano, sempre em época de chuvas.

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Fonte: Correio Braziliense

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